03.07.07 | 2º acto | 1º diaDepois de um fim de semana prolongado em Londres e uma quasi-directa, o Puto deslocou-se a Lisboa para assistir ao melhor cartaz de 2007
so far.
Quando cheguei tocavam os The Gift, presença habitual em festivais, eventos e romarias de todo o país. Apesar de gostar de alguma da música que fizeram, acho que a pose de vedetismo não lhes fica nada bem.
Os Klaxons tiveram contra eles o facto de tocarem de dia. Toda aquela energia do
rock electrónico não é bem explorada com a luz do crepúsculo. Ainda assim apresentaram o disco de estreia quase na íntegra e provocaram algumas reacções no público. Apesar da habilidade dos putos londrinos, penso que o concerto foi longo demais para quem tem apenas um álbum e apresenta uma sonoridade muito demarcada.
Já pelo início da noite subiram ao palco os Magic Mumbers. São um quarteto simpático e honesto, e isso transparece no palco. Caso invulgar de sucesso no Reino Unido, pois a sua
pop solarenga herdada dos anos 60 na costa oeste norte-americana, pincelada aqui e ali pela
folk, não alinha com os movimentos em voga, mas essa luz da Califórnia conseguiu cativar bastantes presentes. Palmas para aquele baixo!
Segunda vinda para os Bloc Party (houve alguém que os apelidou de Blac Party) a Portugal este ano, mas desta feita houve uma maior abordagem ao álbum de estreia, o preferido da maior parte das pessoas, tal foi o entusiasmo com que foram recebidos os temas. Não faltaram alguns dos melhores temas (“Like Eating Glass”, “So Here We Are”, “Two More Years”, “Helicopter”, etc.) e, apesar das oscilações e da voz de Kele Okereke não estar na melhor forma (aqueles agudos custavam), presentearam-nos com um concerto enérgico e bem disposto para um público que os conhece cada vez melhor e os aprecia cada vez mais. Ao que parece, esse sentimento é recíproco.
O primeiro dia do segundo acto pertenceu, sem dúvida, à banda canadiana no alinhamento. Grande parte das pessoas estavam ali para assistir a uma comunhão. Muitos para os ver pela primeira vez, alguns para reforçar a experiência de Paredes de Coura, e para isso o cenário nocturno e o aparato sumptuoso em palco ajudaram bastante. É no palco que todo o
pop sinfónico dos Arcade Fire se projecta melhor, provocando arrepios e induzindo emoções numa plateia que claramente os adora. Percorreram maioritariamente o último álbum, que funciona muito bem ao vivo, mas as incursões em “Funeral” mereceram um entusiasmo extra do público, que não se cansava de entoar os coros e as linhas melódicas mesmo depois dos temas acabarem, que valeram alguns elogios de Win Butler. Foram irrepreensíveis e incansáveis, e continuam a transpirar empenho e honestidade, seja para 100 ou para 10.000 pessoas. Vieram para ficar.
04.07.07 | 2º acto | 2º diaFoi com desagrado que soube da notícia do cancelamento dos The Rapture, pois tinha muita curiosidade em ver como a sua sonoridade
punk funk soava em espaço aberto.
Não cheguei a tempo de ver os Linda Martini, pois o tempo tinha aquecido e ver concertos com aquela temperatura cansa a dobrar.
Vi a actuação diurna dos Clap Your Hands Say Yeah, que não arrancou grandes aplausos do público. Ainda assim gostei de ver transportas para o palco canções como “Over and Over”, “Satan Said Dance”, a versão não distorcida de “Some Loud Thunder”, “Upon This Tidal Wave of Young Blood”, “Yankee Go Home”, “In This Home On Ice” e a excepcionalmente bem recebida “The Skin Of My Yellow Country Teeth”. Espero poder ver este quinteto de aspecto tipicamente
american indie em breve num espaço mais pequeno e com público mais entusiasta.
Já pelo anoitecer rebentaram os Maxïmo Park (julgava que o nome da banda derivava do nome do parque moscovita que homenageia Máximo Gorki, mas pelos vistos tem a ver com o Maximo Gomez Park, um mítico local de encontro para cubanos revolucionários). Explosivos nos temas mais fortes (especialmente nos
singles “Graffiti”, “Apply Some Pressure” e “Our Velocity”) e cativantes em temas mais amenos, onde a presença e apelo de Paul Smith constitui um ponto forte. Comparo-os aos Pulp em vários aspectos, sendo que um deles é facto do carisma da banda pertence ao vocalista. Proporcionaram bons momentos e fizeram valer bem a curta carreira.
Os recém-reunidos The Jesus And Mary Chain justificavam a presença de muito pessoal de negro vestido. Os pioneiros de um certo
noise pop provaram que são os pais de uma escola e que sabem bem a lição, apesar de tantas atribulações no núcleo da mítica banda. Jim Reid apareceu com ar impecável (bem mais que o irmão William) e fez-nos regressar a alguns dos melhores momentos da carreira dos escoceses. Sorri várias vezes durante o concerto.
Mais consensual foi a opinião que colhi acerca dos LCD Soundsystem, da qual partilho. Os conceitos de concerto e de festa misturam-se, proporcionando momentos de celebração e comunhão entre o público e entre este e a banda, apesar de isso não constituir nenhuma surpresa para mim. Deu-me a “dor da burra” várias vezes devido ao apelo corporal. Ainda houve tempo para “No Love Lost”, uma recuperação da era pré-Joy Division.
04.07.07 | 2º acto | 3º diaQuando cheguei, acabavam de actuar os X-Wife. Esperei até ouvir a voz de Beth Ditto a clamar pelo público. Ela é detentora da presença (física e não só) e do estilo da banda. A sua voz poderosa aliada a uma secção rítmica muito eficaz impeliu toda a gente a dançar, maioritariamente devido aos temas do último álbum, principalmente com a saída ao som do interventivo “Standing In The Way Of Control”.
Ainda durante o dia entraram em palco uma das bandas que mais ansiava ver. Os TV on The Radio reinterpretam com energia alguma aceleração os temas que conhecia em disco, abordando-os com mais expansão. Aquele
cocktail sonoro deliciou-me. Os contrastes constituem harmonias, as vozes embrenham-se nas guitarras (ai, aquelas guitarras!) e parecem abraçar o céu e o inferno. Houve momentos de euforia em “Wolf Like Me” e “Staring At The Sun”, os temas mais reconhecíveis, mas a prestação, no seu geral, contaminou-me. Espero um regresso em breve.
Ainda vi e ouvi um pouco da prestação dos Scissor Sisters, para quem a designação “show” assenta como uma luva. Autênticos animais de palco, muito competentes na animação das massas devido ao seu carácter provocatório e hedonista. “Mostra as mamas”, disse Ana Mantronic com sotaque brasileiro antes de “Tits On The Radio”. Só tenho pena que a presença da banda tenha suscitado alguns comentários homofóbicos no público. E eu que pensava que Lisboa era uma cidade mais evoluída. ‘Tá bem, Toninho.
A razão para a enchente do último dia chamava-se Interpol. A estreia em Portugal, após terem recusado uma vinda em 2005 alegando fracas vendas (onde anda a cabeça destes músicos?), era aguardada por pessoal de várias faixas etárias. Sinceramente, gostei muito do concerto, apesar de não haver grande variação entre o registo discográfico e ao vivo. Só a presença e a estabilidade do conjunto chegaram para me arrebatar. Escolha sensata de temas, entre alguns do mais recente álbum e o restante com um equilíbrio entre os dois primeiros discos. Não faltaram indispensáveis como “Obstacle 1”, “Slow Hands”, “PDA”, “Evil” ou “NYC”, mas senti a falta de outros, como “Untitled” ou “Take You On A Cruise”. Não, “C’mere” não é indispensável. Deixaram-me com apetite para os ver novamente em Dezembro.
Vencido pelo cansaço do momento, sentei-me para ver os veteranos Underworld. Recordei com agrado temas de “Dubnobasswithmyheadman” e outros de trabalhos mais recentes, mas rumei ao Incógnito para acabar a noite. Junto ao balcão estava Paul Banks, Tunde Adebimpe e mais dois membros dos TVOTR. Acabei por ficar até fechar, queimando as minhas reservas de energia ao som de boa música.
Só um aparte: que mania é essa das bandas novas de Nova Iorque terem sempre uma ou mais músicas dedicadas à sua cidade? Parece uma adoração a rondar a ostentação...